Depois de completamente suacateado, o ferry-boat dose-dupla “Agenor Gordilho” foi para o fundo. Virou “atração turística” para mergulhadores. Outros ferries desapareceram. (Foto: Arquivo/Jornal da Mídia)
REDAÇÃO DO JORNAL DA MÍDIA
O que esperar de um sistema de transporte que vem sendo sucateado desde 2007, sob o olhar omisso do Governo da Bahia? Nada, além do caos. E o que esperar de um governo que “turbina” um projeto faraônico como o da ponte Salvador-Itaparica, prometida desde 2008 pelo então governador Jaques Wagner para ser inaugurada em 2013, e que nunca sai do papel?
O caos estabelecido nas últimas 24 horas no Sistema Ferry-boat é a soma do descaso, da omissão e da incompetência em se gerir um sistema que nunca esteve tão no fundo do poço, como atualmente. Para embalar o ano eleitoral de 2022 investe o governo no sonho da ponte Salvador-Itaparica, como já aconteceu nas três últimas eleições (2010, 2014 e 2018), e assiste o povo penar e sofrer para utilizar um serviço de terceiro mundo.
Foram 14 horas de espera para se atravessar de Bom Despacho, na Ilha de Itaparica, para Salvador, nas últimas 24 horas. Um recorde na história do Sistema ferry-boat, criado em 1972 pelo então governador Luiz Viana Filho. Anteriormente, já houve registros de fila com espera de 6, 8 e até 9 horas. Mas 14 horas, é um recorde histórico.
A Internacional Travessias aportou na Bahia depois que o então governador Jaques Wagner foi buscá-la no Maranhão, junto ao pessoal de Sarney, para presentar a população baiana com um serviço bem pior que aquele que vinha sendo prestado pela concessionária anterior, a TWB. Wagner e o médico ortopedista Otto Alencar “descobriram” a Internacional, que já prestava um serviço considerado ordinário na travessia Santos-Guarujá, no litoral paulista.
O médico ortopedista Otto Alencar, então vice-governador e secretário de Infraestrutura, foi ver de perto em 5 de maio de 2013 como ficou a reforma do ferry “Juracy Magalhães”. O Estado investiu na época mais de R$ 40 milhões e entregou o Sistema Ferry-boat à Internacional Travessias. (Foto: Arquivo/Jornal da Mídia)
Wagner era o governador e o ortopedista Alencar o comandante da Secretaria de Infraestrutura. A Seinfra era à época a pasta do Governo da Bahia que “fiscalizava”, como é até hoje diz, o Sistema-Ferry-boat, através da Agerba. A frota de navios, que é totalmente do Governo do Estado (a Internacional nunca investiu um centavo na compra de embarcações), vem sendo sucateada de forma aberta e escancarada.
Navios viraram sucatas e desaparecem
As embarcações estão apodrecendo. Uma já foi para o fundo do mar da Baía de Todos-os-Santos (Agenor Gordilho) e agora é “atração de mergulho”, para incentivar o “turismo náutico”, segundo a Secretaria de Turismo (Setur). Um outro, o “Gal Costa”, acabou vendido como ferro-velho. Outras embarcações ninguém sabe mais onde foram parar, como os ferries Vera Cruz e o Ipuaçu.
São tantos navios do Sistema Ferry-boat que deixaram de operar desde 2012 , que fica difícil saber hoje, com precisão, quantos ferries ainda estão na frota do sistema e em condições de tráfego. Pelo menos nos boletins diários que divulga, a Internacional Travessia, companhia ligada à família Sarney do Maranhão diz sempre que tem “quatro, cinco ou seis embarcações em tráfego”.
Em um evento no extinto Centro de Convenções da Bahia, em 2008, Wagner exibiu um poster do que seria a “ponte Salvador-Ilha de Itaparica”. E garantiu: “Vamos inaugurar essa ponte em dezembro de 2013”. O poster nada mais era que uma antiga e já granulada foto da Odebrecht que se encontrava nos arquivos da extinta Companhia de Navegação Baiana desde os anos 90. (Foto: Arquivo/Jornal da Mídia)
Mas em 2013, quando a Internacional assinou um contrato emergencial de seis meses para gerir o Sistema Ferry-boat, a frota de embarcações era composta pelos seguintes navios: Vera Cruz, Mont Serrat (hoje Pinheiro), Juracy Magalhãe Jr., Agenhor Gordilho, Gal Costa, Maria Bethânia, Ipuaçu, Rio Paraguaçu, Ivete Sangalo e Ana Nery.
Os dois navios mais recentes, Zumbi dos Palmares e Dorival Caymmi foram adquiridos na Grécia pelo Governo da Bahia. Repetindo: a Internacional não tem um centavo sequer aplicado na frota. Recebeu tudo de mão beijada do Estado e mesmo assim não consegue deslanchar e oferecer um serviço à altura dos baianos.
No início de 2014, a Internacional assinou o contrato de concessão de 25 anos com o Governo da Bahia. E para assumir a gestão do Sistema Ferry-boat, a companhia recebeu todas embarcações reformadas. Foram mais de R$ 40 milhões investidos pelo Estado na recuperação e reforma das embarcações, segundo informou na época o médico ortopedista Otto Alencar, então vice-governador e secretário da Seinfra. A pasta de Otto era a dona do maior orçamento do Governo do Estado. Além da Agerba, tinha em sua estrutura, o histórico Derba (já extinto), que cuidava das rodovias. E tinha também e tinha também órgãos das áreas de energia e comunicações da Bahia.
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Desde 2007, no início do governo de Jaques Wagner, a empresária Lenise Ferreira vem denunciando o sucateamento da frota do Sistema Ferry-boat.Várias denúncias foram protocoladas no Ministério Público da Bahia. (Foto: Arquivo/Jornal da Mídia)
“O sistema vai de mal a pior”
Mesmo antes de assumir o contrato de concessão com o Estado da Bahia, em 2014, os usuários já reclamavam dos serviços da Internacional, que era “Marítima”, mas que na Bahia passou a ser Internacional Travessias. A empresária Lenise Ferreira, que utiliza o ferry-boat quase que diariamente, declarou em matéria publicada em 6/06/2013 por este JORNAL DA MÍDIA:
“Realmente o sistema vai de mal a pior e não digo que existe omissão da Agerba. O que existe é a velha permissividade de sempre. As embarcações continuam quebrando constantemente. Nada de consertos para durar 10 anos. As primeiras viagens dos navios recém “maquiados” bastaram para colocá-los no estaleiro. Funcionários denunciam que não houve troca de motor no ferry Pinheiro, como garantiu a Agerba. Insatisfeitos com os baixos salários, não poupam criticas à concessionária. Os ferries Ana Nery e Ivete continuam a mesma cachaça de sempre. Um porre com direito a muita ressaca”, sustentou Lenise.
A empresária despejou mais críticas ao quadro da época do sistema:
“O ferry ‘Agenor Gordilho’ me assustou em uma viagem no último dia 2. Um forte cheiro de óleo queimado exalava por todo o salão de passageiros incomodando a todos. Fazia muito calor e o ambiente estava abafado, pois todas as janelas foram lacradas, sabe Deus por qual motivo. Alguns passageiros solicitaram a abertura das portas laterais. O marinheiro assim o fez, quando então percebi que não existem grades de proteção: era a porta aberta e o mar. Crianças brincavam no salão, o que me apavarou. Chamei um membro da tripulação e pedi que a porta permanecesse fechada, pois oferecia risco maior estando aberta. Denunciei o fato à Capitania dos Portos”.
Em outra reportagem, o JORNAL DA MÍDIA também alertava:
Mais uma reportagem do Jornal da Mídia já mostrava que a Internacional Marítima prestava serviço de baixa qualidade:
Quase uma década depois, nada mudou.
Quase uma década depois, os problemas da Internacional Travessias em gerir o Sistema Ferry-boat continuam e só se agravam: 14 horas de fila e caos no Terminal de Bom Despacho comprovam tudo. Mostram também a omissão e a negligência da Agerba. A agência do governo da Bahia não regula nada e nem fiscaliza coisa nenhuma. Fora os aumentos bondosos liberados para alguns serviços concedidos, como o reajuste de quase 400 por cento para a tarifa de embarque no Terminal Náutico, explorado pela Socicam Clique AQUI e leia), ninguém sabe mesmo, de verdade, quais são as outras atribuições da Agerba. (Leia matéria sobre este assunto aqui, quarta-feira, 20)