Às escondidas, os feirantes comentam um só assunto: os casos de coronavírus na Feira de São Joaquim, a maior de Salvador. Em apenas uma semana, foram quatro mortes associadas à covid-19. A informação foi divulgada neste sábado pelo jornal Correio.
A publicação diz que comprovou duas das quatro mortes por documentos acessados. “Hoje, uma vendedora de galinhas está internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital público. Outro comerciante ficou em estado grave por duas semanas, depois de contato com outro feirante contaminado. O espaço está aberto e todos acreditam que a Semana Santa tenha sido o estopim das contaminações”, relata o Correio..
Durante oito dias, a reportagem do Correio colheu relatos, buscou documentos e conversou com feirantes. Eles falam em oito mortes desde o início da epidemia, mas não conseguimos provas dos óbitos. Dos mortos, dois eram comerciantes vítimas da covid-19; um ex-comerciante da feira e pai do dono de uma loja de tecido que frequentava quase diariamente o local e morreu com infecção respiratória aguda, suspeita de coronavírus; e outro infartou na feira – uma das possíveis complicações da doença, mas sem confirmação de familiares, nem amigos, de que tenha sido este o caso dele.
Os feirantes calculam, de cabeça, uma média de 15 casos de coronavírus no perímetro onde atuam. É bom lembrar que cada um deles ocupa uma porção dos 38 mil metros da Feira – o equivalente a quase quatro campos de futebol – e o que sabem refere-se apenas à área onde trabalham. O espaço é dividido por ruas, com os respectivos nomes dos produtos mais vendidos. Uma cidade dentro de outra, brincam os comerciantes.
Nenhum comerciante aceitou falar publicamente com a reportagem, com receio de represálias dos colegas e do próprio futuro da feira, da qual dependem diretamente. Alguns deles desconversaram. Outros desligaram a ligação. Os decretos restritivos não incluem a feira, que presta serviços considerados essenciais e está aberta. Diferentemente de mercados, no entanto, não há nenhuma medida de controle de entrada de consumidores na Feira.
A morte mais recente – pelo menos, oficialmente notificada – foi a de Nestor Lessa de Souza, 62 anos, fornecedor de frutas que, há três décadas, trabalhava na Rua do Quiabo, em São Joaquim. Nestor morreu às 0h45 do dia 9 de maio, no Hospital do Subúrbio, segundo atestado de óbito acessado pela reportagem. “Não vou mentir para você não, aqui na Feira são muitas situações [de coronavírus]”, disse o dono de um bar.