REVISTA ÉPOCA
Bela Begale
(Reprodução)
“Vou resolver essa história olho no olho. Não tem isso de filho com carta. Tem de conversar”, disse o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na sexta-feira dia 13 a um de seus interlocutores sobre a crise instaurada na sua defesa e que pode culminar na saída do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e principal nome entre os defensores do petista, Sepúlveda Pertence. No quarto andar da sede da Polícia Federal em Curitiba, Lula conversou com Evandro Pertence, filho do advogado, que foi incumbido de levar a carta ao líder petista. Nela, seu pai pede para deixar a banca do ex-presidente. De moletom cinza, Lula sentou-se com Evandro na mesa de quatro lugares em que se reúne com quem o visita na cela de 15 metros quadrados — apertada como uma van, mas duas vezes maior que a cela em que Nelson Mandela foi mantido.
Na carta de renúncia à defesa de Lula, Pertence se queixou de ter sido surpreendido por uma nota pública que atacava o ministro do STF Edson Fachin, relator da Lava Jato, acusando-o de fazer manobras na tramitação de seus pedidos de liberdade para dificultar que o ex-presidente saia da cadeia. O comunicado, assinado pelo petista e tornado público em 3 de julho, foi iniciativa de Cristiano Zanin e Valeska Teixeira, casal que também atua na defesa do ex-presidente. Na carta, Pertence também reclamou do pedido de habeas corpus impetrado pelos deputados Paulo Pimenta (PT-RS), Wadih Damous (PT-RJ) e Paulo Teixeira (PT-SP), sem consultá-lo, na rocambolesca tentativa de soltura de Lula no domingo 8 de julho. Segundo Pertence, o partido estava tomando a frente do caso. O ex-ministro finalizou o manuscrito dizendo que era “com pesar” e “profunda dor” que pedia para se desligar da defesa.
A ideia inicial era que Evandro Pertence fosse de Brasília para Curitiba na quarta-feira dia 11, na companhia do advogado Sigmaringa Seixas, amigo de Lula e um dos principais articuladores da causa da libertação do ex-presidente junto ao Supremo. No entanto, o filho de Pertence perdeu o voo. O encontro acabou ficando para sexta-feira. Àquela altura, Seixas já havia preparado o terreno para a reunião de Evandro Pertence com Lula. Em uma conversa de três horas com o ex-presidente, Sigmaringa antecipou que Sepúlveda Pertence queria deixar a causa. Disse que o ex-ministro do Supremo, do alto de seus 80 anos, sentia-se desrespeitado por Zanin e Teixeira, genro e filha de Roberto Teixeira, compadre de Lula. As brigas compradas pelo jovem casal com o STF estavam acarretando a Pertence um ônus que ele não queria carregar a esta altura da vida, resumiu.
“Não quero ler esta carta. Diz que nem precisa trazer”, respondeu Lula a Seixas. Apesar do alerta, Evandro Pertence seguiu para Curitiba e deixou o manuscrito nas mãos do ex-presidente, que se recusou a lê-lo na sua frente. Aborrecido, comentou com policiais que, em vez de seus advogados trabalharem para ele, era ele, Lula, quem estava tendo trabalho com seus advogados. Lula não aceitou a renúncia e mandou a Sepúlveda Pertence o recado de que o espera para uma conversa olho no olho. Disse que os advogados podem avaliar um novo formato de trabalho, mas destacou também que não pode abrir mão de Zanin e Teixeira, dupla em que confia. Argumentou que, além da defesa técnica de Pertence, não pode abrir mão de uma defesa política, já que não é apenas sua liberdade que está em jogo, mas a eleição presidencial deste ano, na qual ele se apresenta como candidato. Por essa razão, o petista não deixou o imbróglio jurídico atrapalhar o que mais lhe interessa, mesmo na cadeia: as articulações políticas.
O tempo de Lula na cadeia não é consumido apenas com advogados e políticos: ele quer receber quem puder vê-lo e tenha autorização da Justiça. Todas as segundas-feiras, ele recebe em sua cela alguma liderança religiosa escolhida pelo ex-ministro Gilberto Carvalho. A conversa mais recente foi com Nadal Alves Gomes, bispo da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil. Durante o encontro com o bispo anglicano, Lula até recebeu hóstia.
Recentemente, o petista papeou com o pai de santo do terreiro de umbanda Cabana do Pai Tobias da Guiné, um dos mais conhecidos do Paraná. Na agenda, há encontro programado com um rabino do Rio de Janeiro. Apesar de nunca ter sido visto rezando pelos agentes da PF, o petista mantém na cabeceira da cama os presentes que recebe dos visitantes, que vão de santos católicos a orixás. Os filhos Luís Cláudio, Fábio Luiz e Lurian também veem o pai todas as quintas de manhã. Nas férias de julho, os netos do petista passaram a integrar a comitiva.