JACIARA SANTOS
Chame o ladrão!
Na tentativa atabalhoada de esconder o óbvio – o fracasso da política de segurança do estado – a polícia baiana está metendo os pés pelas mãos no que se refere às pichações de origem não identificada sobre a violência no bairro do Rio Vermelho. Em vez de cerrar fileiras contra a bandidagem que inferniza a vida de quem mora, estuda, trabalha ou meramente passa pelo local, nossos bravos xerifes direcionam seu arsenal de intimidação a quem tenta alertar os incautos quanto aos riscos da área.
À luz fria da lei, pichação é crime. Faz parte do conjunto de condutas tipificadas como dano qualificado, passíveis de enquadramento no Artigo 163 do Código Penal Brasileiro, para quem “destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia”. As penas previstas para o delito inclui detenção que varia de um a seis meses (casos mais brandos) a até três anos em circunstâncias mais graves e com uso de violência.
E é nessa brecha legal que as autoridades de segurança estão se apoiando para desviar o foco principal da questão. Afinal, quem produz maior dano à sociedade: pichadores de muros ou ladrões, estupradores e homicidas que aterrorizam a população?
Mas essa não é uma tática nova. Nossos gestores são pródigos em manobras para tentar esconder o sol com a peneira. Exemplo recente dessa estratégia equivocada ocorreu com a recente greve da Polícia Militar. Todo o mundo sabia que os policiais estavam amotinados, menos a cúpula governamental. E deu no que deu. Somente quando a situação havia fugido ao controle é que o movimento paredista foi reconhecido. O desfecho da história todos já conhecem.
Mas, voltemos ao nosso boêmio bairro do Rio Vermelho. Autoridades de segurança taxam de alarmistas os avisos sobre a insegurança da área que foram espalhados em muros e postes por anônimos. Em entrevista a um jornal local, policial da 7ª Delegacia Territorial, apresenta duas hipóteses para explicar a autoria das pichações: especulação imobiliária ou concorrência desleal entre estabelecimentos comerciais.
Segundo o experiente investigador, especuladores imobiliários poderiam estar atuando no sentido de forçar a redução nos preços dos imóveis (alguns deles avaliados em cifras de sete dígitos). Há também a suspeita de que proprietários de restaurantes estariam por trás da ação, gerando um clima de insegurança em algumas ruas para atrair a clientela de concorrentes.
As suposições do policial podem até vir a se confirmar, mas não contam com a aquiescência de boa parte da comunidade. Em cada esquina, um relato. “Suspendi um tratamento de acupuntura que fazia numa clínica do bairro, depois que dois meninos me assaltaram com um caco de garrafa”, diz uma jornalista que prefere manter o anonimato. “Só saio em grupo, depois da aula”, faz eco a universitária D.P.N., 23, estudante de uma faculdade estabelecida na área.
Tática terrorista?… Pois sim! Essa, certamente, não deve ser a opinião da pensionista Elizabeth Gusmão Hufnagel, 65, mãe de André Luís Hufnagel, morto ao tentar defendê-la de um assalto na modalidade saidinha bancária, no Rio Vermelho, três semanas atrás.
O cenário do latrocínio (matar para roubar) foi a Rua Vieira Lopes, próximo à chamada Rua do Canal, a 500 metros da casa da vítima. A propósito, em vez de caçar pichadores de muros e buscar explicações fantasiosas para as pichações, por que a polícia não se dedica a buscar os autores desse crime hediondo? (À Queima Roupa)
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